Uma moça morreu no cruzamento das
ruas Sebastião Antas com a Álvaro Ribeiro, no centro de Americana. Vinha de
moto, um carro avançou o pare; no impacto da colisão o capacete soltou-se e ela
bateu com a cabeça no chão.
Alguém do meu condomínio foi até
o local e descreveu a moça, morta instantaneamente: olhos abertos; bonita,
cabelos negros, misturados ao sangue, os braços estendidos. Em meu recolhimento
dolorosamente pensei " de olhos abertos, fitando (sem ver) o azul do infinito
na manhã de sol".
Quando acontece uma morte como a
dessa mocinha, tão brutal, o que me devasta, antes de tudo, é a ideia do
impacto da chegada da notícia ruim no seio da família. Depois vem o questionamento:
para uma vida, finada assim, tão prematuramente, o que ela, ou nela, deixa de
se realizar? O que se inicia logo após a morte? Nada? Como penetrar o enigma
que se insinua perturbadoramente por trás dessa palavra: nada. A escuridão
total, ou uma luz intensa, que também cega? Deus, em sua ofuscante majestade? Se
há uma forma individual de continuar existindo após a morte, esse é o desafio
maior à nossa imaginação, à nossa sensibilidade. Penso na morte desde criança.
Todos deveriam pensar. Freud, o criador da psicologia moderna aconselhou: “se
queres a vida, prepara-te para a morte”. Mais reflexivos, pensando nela, quem
sabe haveria mais cuidado com esse bem maior, a vida.
No Brasil ninguém é punido por
matar alguém no trânsito. Vidas se vão e permanecem impunes esses propagadores
do luto; até que, diante da própria morte, no último instante, eles sejam
devastados pela consciência de terem sido responsáveis pelo sofrimento alheio;
a sua terrível dívida.
Em minha memória ficará esse
sábado ensolarado quando, abaixo da minha janela, a vida de uma mocinha foi
tirada; acolha-a — junto, a dor de sua família — o nazareno Deus do sofrimento.
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